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Uma Carta de Amor

O Natal de 99 foi o primeiro Natal depois de conhecer o Carlos, eu tinha que lhe dar um presente, mas que presente?… o que é que eu podia dar ao Carlos que não fosse banal, não fosse demasiado caro, que o surpreendesse… e que fosse único!

Quando eu passo por estes momentos de procurar o quase impossível, só tenho uma solução: criar a distância suficiente para me alhear do “problema” e partir sem destino,… a solução está sempre nos livros… como diria o Manuel António Pina, “cada um vai buscar ao poema o que lhe pertence”… o Mistério que se vive em época de Natal tem a magia necessária para ajudar a encontrar o que se precisa de dar de si… e eu encontrei, numa livraria antiga da baixa, um livro estreito, comprimido no esquecimento dos anos, lá estava à espera que eu chegasse!… uma cinta de papel vermelho identificava os vários colaboradores desse livro. Conhecia quase todos, nem queria acreditar! Entre poetas, escritores, artistas das belas artes do Porto…

Ora eu ia fazer daquele livro uma verdadeira obra de arte. Vou pedir aos que conheço que assinem e desenhem algo que personalize este livro. O Carlos era conhecedor de Arte… eu iria colocar a Arte a dirigir-se a ele.

Saí da livraria com Todos os Sonhos do Mundo!… só uma pessoa me podia ajudar, um dos que também fazia parte daquele compêndio, o Manuel António Pina.

Sem esperar mais, telefonei-lhe e encontrámo-nos no Café Orfeuzinho!… Disse-lhe:
– Pina, apaixonei-me!…

Os olhos sorriram com a luz reflectida nas lentes dos seus óculos, não disse nada, esperou e perguntou:

– Eu conheço-o?

– Penso que sim, o Carlos disse que fizeram tropa juntos, o Carlos era o Chefe do Protocolo do Quartel-General e, depois Ajudante-de-Campo do General Martins Soares. Lembra-se do Pacheco de Miranda ter pedido uma audiência ao General relacionada com a ida do Pina para o JN?

– Já sei! O Carlos Pinho, que chegava por vezes de Mercedes ao Quartel… pertencíamos a famílias políticas diferentes, eu gostava dele, inteligente e bom defensor dos seus pontos de vista. A cooperativa Árvore vai fazer daqui a dois dias o jantar de Natal, a Ana Maria vai lá e eu digo aquela gente para lhe assinarem os artigos.

Dois dias depois lá estava eu… o Pina andou comigo de mesa em mesa feliz porque dizia… vá escreve aí!… para a Paixão da Ana Maria, escreve que te importa a ti quem é, se é a Paixão é importante… ria-se, colocava o braço nos meus ombros enquanto os dois víamos se nos agradava o que os outros escreviam!

A Prenda foi e ainda hoje é um sucesso, é única… um livro conotado com a esquerda política, mas pergunto se ter ideais tem de ter um lado na vida, se sonharmos juntos tem estereótipos?

Dois anos depois nascia o Jaime, entre muitos o Manuel António Pina esteve presente no baptizado.

Este Homem militante de uma Vida justa e livre que, a seguir ao 25 de Abril depois de sanearem o General Martins Soares, agradeceu ao General (então só de Poder e Amigos), este Homem, que foi o principal suspeito de um atentado ao quartel General… foi agradecer ao Homem que antes do 25 de Abril lhe deu a liberdade para exercer a profissão que desempenhou mais de 30 anos no Jornal de Noticias… agradecimento, em visita, que descreveu numa crónica com o título ”As Lágrimas do General”.

O Pina percebeu que naquele momento em que lhe confessei a minha paixão, era dono de um sonho que ajudaria a concretizar… Amor e Amizade ligados por um fio condutor, só possível pela ternura sã dos que nunca desistem de acreditar.

Um Homem Espiritual, lúcido e brilhante. As diferenças vividas com lealdade é que suportam a beleza da Humanidade.

Um homem brilhantíssimo e, lúcida e intrinsecamente bom.

Ana Maria Príncipe

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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