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A ignorância

© Lusa

Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos céus.
Mateus 5:3-9

Assim que se acabou o frenesim das eleições legislativas, tivemos depois o folhetim da formação do novo governo. Quem o iria constituir e quanto tempo durará ? E claro, será que vai ser o Chega a derrubar o governo ? Obviamente que não sei a resposta a nenhuma destas perguntas. Por alguma razão a palavra ignorância aparece no título.

Curiosamente, ignorância é também por estes dias uma palavra muito associada ao Chega. Por exemplo, já todos estamos fartos de ouvir que ao arredar o Chega do governo, se ignorou o voto de mais de um milhão de portugueses. Eu burro me confesso, porque não entendo porquê. O PS teve 800 mil votos a mais do que o Chega, e não escandaliza ninguém que esteja na oposição. Porque é que os eleitores do PS podem ser ignorados, mas os do Chega não ? E os mais de 900 mil votantes nos restantes partidos que também elegeram deputados, esse podem ignorados ? E os mais de 100 mil votos no ADN, podem ser descartados como uma anomalia?

É óbvio que os eleitores do Chega podem ser ignorados, porque foi exactamente isso que foi sendo feito até agora. Aliás, tal como no futebol, não há justiça nos resultados de eleições livres e participadas. O objectivo de umas eleições é escolher quem, e como, vai gerir os interesses da comunidade e não dar uma medalha de participação a cada partido. Quem perde as eleições vai para a oposição, quem ganha forma governo. De uma forma muito cínica, se o Chega, ou qualquer outro partido, não quer ser ignorado, a única solução é ganhar as eleições. E por muito, porque senão aparece-lhe um vira-latas estilo António Costa para lhe roubar o pão no momento em que se prepara para o vai trincar.

Dizem-me que o voto no Chega é sobretudo um voto de protesto, e que foi exactamente por terem sido ignorados que muitos eleitores agora se voltam para o Chega. É possível que sim, eu novamente ignorante me declaro. Concordo que ignorar o protesto é a melhor forma de garantir que aumenta. Mas se o eleitor do Chega está contra o país que temos, então é a favor de fazer o quê?

Aqui esbarramos de frente no problema causado pelo milhão e tal de votos. Um protesto não faz os hospitais funcionar melhor, um protesto não faz aumentar os salários, protestar quanto muito chama a atenção para um problema. Não o resolve. E quem se der ao trabalho de ler o programa eleitoral do Chega, ou de ouvir o André Ventura, que me indique onde é que está a diferença para o que foi feito pelo PS nas últimas décadas. Eu admito que sou enviesado, afinal sou membro da Iniciativa Liberal. Mas mesmo assim, a semelhança entre as propostas do Chega e de boa parte da esquerda é por demais evidente. Se não gostam do estado a que isto chegou, porque é que seria diferente com o Chega, seja no poder seja a apoiar um governo?

Pior, a legislatura ainda nem par de meses leva e já tivemos o Chega a boicotar a eleição, meramente formal, do Presidente da Assembleia da República proposto pelo governo. A dizer publicamente que em matéria de impostos está mais perto do PS do que da direita. E ontem mesmo a anunciar que vai propor no Parlamento a condenação formal do Presidente por ter sugerido que Portugal deveria compensar as ex-colónias. Em suma, boicota o trabalho dos partidos de direita, nos impostos é igual à esquerda e não gosta da liberdade de expressão. Qual é mesmo a diferença entre o Chega e o Bloco ou o PCP?

Nelson Gonçalves

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