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Alienação social, mito ou realidade?

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O “consumo descontrolado” da oferta digital, internet e redes sociais, contribui para um estado de alienação social, desenvolvendo um padrão de comportamento cujas relações online se constituem como a zona de conforto, alerta um estudo divulgado.

“Como a vida na internet e nas redes sociais está em constante movimento, alimenta-se uma necessidade de acompanhar ao máximo o fluir dessa vida, resultando em momentos de prazer e de descontrolo no tempo de utilização”, refere o projeto de investigação “Scroll, Logo Existo“, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia em parceria com o Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências.

O estudo, que é apresentado esta terça-feira em Lisboa, inquiriu 1.704 residentes em todo o país, maiores de 16 anos, com o objetivo de estudar as práticas de uso dos ecrãs e os comportamentos aditivos, tendo a fase de recolha e tratamento de dados decorrido entre setembro de 2022 e outubro de 2023.

Em declarações à agência Lusa, o coordenador do projeto, Joaquim Fialho, afirmou que o estudo “não dá um resultado de um alarme geral sobre a utilização dos ecrãs”, mas aponta um conjunto de características que são transversais a todas as idades, situações profissionais e a todos os níveis de habilitações escolares.

Em primeiro lugar, o investigador apontou “uma necessidade de estar nos ecrãs como fonte de prazer, sobretudo, os ecrãs do smartphone, que são o principal elo de ligação digital”.

Outras características identificadas são “a perda de noção do tempo nos ecrãs”, “a irritabilidade”, causada pela ausência dos ecrãs ou pela redução do tempo de utilização, e a utilização “dos ecrãs como fuga”, para aliviar sentimentos de culpa, ansiedade ou depressão.

Apesar de não haver um problema generalizado de dependência de ecrãs na população portuguesa”, o investigador disse que há fatores que podem gerar maior dependência, como a idade.

“Quanto mais baixa é a idade, mais baixa é a escolaridade, e se cruzarmos estes dois atributos, os estudantes e a população inativa são aqueles que estão numa situação de maior exposição ao risco de dependência de ecrãs”, salientou.

Segundo o investigador, foi identificado também um conjunto de elementos na dependência dos ecrãs, como a nomofobia, sentimento de falta quando o telemóvel não está junto das pessoa, e a “síndrome do toque fantasma”, que é a sensação constante de sentir o telemóvel a vibrar no bolso, que não é real.

Também foi detetado “o transtorno de dependência de Internet”, que é a necessidade compulsiva de estar online, particularmente nas redes sociais, “como obtenção de prazer”, para atenuar sentimentos de frustração, ansiedade.

Outro elemento identificado foi “a depressão Facebook”: “Observámos que a ausência de redes sociais junto dos utilizadores, sobretudo dos mais jovens, que não têm ocupação, gera sentimentos de frustração e ansiedade por não conseguirem acompanhar o conteúdo que está a circular online”.

Os investigadores também identificaram junto dos entrevistados “a hipocondria digital”, que é procurar informação sobre uma doença na Internet que “muitas vezes é contraditória e coloca as pessoas perante uma situação de desespero”.

Com base nos resultados, os investigadores sugerem um conjunto de medidas, nomeadamente a intervenção em contexto escolar, “que são os mais vulneráveis”, na comunidade em geral e em contexto laboral.

No contexto laboral, disse Joaquim Fialho, há “uma barreira muito difícil de distinguir”, nomeadamente quando termina a utilização para fins profissionais e quando começa a utilização lúdica, “porque muitas das vezes não há esse desligar”.

Por fim, uma intervenção mais transversal junto da população, sobretudo, dos que estão fora do mercado de trabalho.

“Há um conjunto de pistas para a ação que temos no plano e que nos parecem que podem funcionar como atenuante deste processo, porque aquilo que verificamos é que há um acesso generalizado aos ecossistemas digitais, mas não há um aumento das competências digitais que permitam de certa forma capacitar as pessoas para a oferta do ponto de vista digital”, rematou.

O investigador salientou que “o desafio não está na privação do uso digital (…) em contexto escolar, nem em contexto laboral, mas sim na capacitação das pessoas para uma utilização saudável”.

“Nós sabemos que proibir não é o melhor caminho, o melhor caminho passa por um trabalho de literacia para a utilização dos ecrãs”, defendeu Joaquim Fialho.

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