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Reino Unido: Uma monarquia com alma republicana (3)

© Raúl Reis / BOM DIA

Esta semana, estava previsto escrever o segundo artigo sobre “Viena Radical’: Um Modelo para Resolver a Crise da Habitação em Portugal“, onde detalharia o modelo de habitação de Viena. No entanto, a crise política em Portugal desenvolveu-se a uma velocidade tão rápida que decidi escrever mais um artigo sobre “Reino Unido: Uma Monarquia com Alma Republicana“. 

Neste artigo pretendo mostrar que, em democracias, eleições antecipadas não são motivo para alarmismo. Contudo, esta crise política não foi causada por falta de condições na governação, mas sim pela inabilidade ou arrogância ao não explicar a relação dúbia da empresa do Primeiro-Ministro, que, como disse o deputado Sérgio Sousa Pinto, se podia chamar “Montenegro Lda”. Em situações como esta, existem exemplos no Reino Unido onde o próprio sistema tem capacidade de auto-regeneração interna, enquanto em Portugal muitas vezes cai de podre.

No dia em que a moção de confiança do governo português foi rejeitada, originando novas eleições legislativas, a minha desilusão foi tão grande que decidi analisar as eleições antecipadas nos últimos 50 anos em Portugal, Espanha, França, Itália, Reino Unido, Alemanha, Suécia, Países Baixos e Dinamarca. Encontrei alguns dados curiosos…

No Reino Unido, em 1974, houve eleições antecipadas em fevereiro. Como o Partido Trabalhista venceu, mas sem maioria absoluta, os britânicos foram a novas eleições em Outubro do mesmo ano e conseguiram uma maioria absoluta tangencial. Em Espanha, além de terem ido a eleições em 2015 e 2016, foram também duas vezes em 2019 por incapacidade de formar governo. O próprio Reino Unido, após o referendo do Brexit, que tinha tido eleições  em 2015, teve eleições em 2017 e 2019. Ou seja, eleições antecipadas fazem parte da democracia, mas não devemos abusar delas…

Portugal, nos últimos 50 anos, tem uma média de eleições legislativas a cada 2.6 anos, com apenas 32% dos mandatos completos. No Reino Unido, os mandatos têm uma duração média de 4.2 anos, com 50% dos mandatos completos de 5 anos. No entanto, no Reino Unido, os governos optam por antecipar as eleições quando as sondagens estão favoráveis. Já na Suécia, 93% dos mandatos foram completos (apenas 2024 houve eleições antecipadas porque o orçamento não passou). Dos 9 países que analisei, Portugal, Espanha e Itália são os que mais têm eleições antecipadas, em contraste com os países do norte da Europa. Os mandatos interrompidos a meio devem ser uma exceção; a regra deve ser que os mandatos sejam levados até ao fim. É, portanto, importante estabelecer uma cultura de consensos entre os partidos com assento na Assembleia da República e perceber que o nosso sistema político é parlamentar. Se houver necessidade de mudar o Primeiro-Ministro, isso não deve levar a eleições antecipadas.

Voltando à última crise política portuguesa, cujo motivo foi a empresa “Montenegro Lda”, fez-me lembrar dois episódios recentes no Reino Unido. O primeiro envolve o atual Primeiro-Ministro Keir Starmer, que, em setembro de 2024, enfrentou um escândalo relacionado a presentes de roupas no valor de milhares de libras, dados a ele e à sua esposa. Apesar de estas práticas serem normais no passado, o Primeiro-Ministro Britânico teve o discernimento de pedir desculpa, anunciou que devolveria os presentes e que alteraria as regras sobre o que os ministros podem aceitar como presentes e hospitalidade. Ou seja, aceitou o erro, pediu desculpa e corrigiu-o, terminando assim o assunto.

O outro episódio foi do ex-Primeiro-Ministro do Reino Unido Boris Johnson, que, apesar de seu carisma, venceu as eleições em 2019 com uma maioria absoluta folgada. No entanto, devido a uma comissão de inquérito parlamentar sobre as festas em Downing Street durante o lockdown, o relatório concluiu que Johnson “enganou deliberadamente” os parlamentares, levando os próprios membros e deputados conservadores a obrigá-lo a demitir-se. Para não falar da sua sucessora Liz Truss, que durou apenas 46 dias no cargo. Ao demonstrar incompetência para ser Primeira-Ministra, foram novamente os deputados conservadores que a obrigaram a demitir-se. Ou seja, os círculos uninominais, em que os eleitores elegem diretamente os seus deputados no Reino Unido, funcionam como contrapoder à liderança do próprio partido. Já em Portugal, os deputados são escolhidos pela cúpula, a concentração de poder não promove a autocrítica e muitas vezes deixa os partidos num beco sem saída…

Montenegro tinha duas alternativas para resolver o problema: seguir o exemplo de Keir Starmer e suspender a atividade da empresa, ou o próprio PSD seguir o exemplo do Reino Unido, ou seja, impor a “Alma Republicana”.

Tiago Corais

BIBLIOGRAFIA:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Elei%C3%A7%C3%B5es_legislativas_de_Portugal
https://app.congreso.es/consti/elecciones/generales/index.jsp
https://en.wikipedia.org/wiki/Next_United_Kingdom_general_election
https://en.wikipedia.org/wiki/Legislative_elections_in_France
https://en.wikipedia.org/wiki/Elections_in_Germany
https://en.wikipedia.org/wiki/Elections_in_Italy
https://ficheiros.parlamento.pt/DILP/Publicacoes/folhas/62.ResultadosEleitorais/62.pdf
https://en.wikipedia.org/wiki/Elections_in_Sweden

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