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Por fim uma carranca

Conheço o nome Carlos Carranca há muitos, muitos anos. Essencialmente de ver referências ao seu nome, a si, aos seus contactos, no JL – Jornal de Letras, e também no Jornal de Coimbra.

O nome Carlos Carranca para mim estava, esteve sempre associado a Miguel Torga. (…)

Mentalmente, lá bem no cimo, numa bolinha no cume da cabeça senti, ficou registado Carlos Carranca, como que a fazer carrancas à minha cinzenta massa, um escol sem movimento.

Muito, muito recentemente, pelas redes sociais fui tendo contacto unipessoal com ele. Sozinho. A ver o seu bulir. Para mim não ousaria falar com tal figura.

Um dia ultrapassei esse desiderato e passei a dirigir-lhe palavras de circunstância. Até que tenho retorno.

Tive oportunidade de dizer algumas coisas a Carlos Carranca. Falei-lhe da minha paixão por Torga, e que a si o via, como já escrevi, como ligação a Torga e a Coimbra.

Todos os dias via um Carlos Carranca a fazer e simultaneamente a receber carrancas da, e, na vida – a sério que não é eufemismo, e se tanto, coincidência.

Todos os dias calava só para mim que a vida daquele homem era cada dia menos vivo.

Pena não poder (?) recuperar algumas frases que trocámos via Facebook.

Um dia o senhor Carlos Carranca – decorrente das conversas não muito além de circunstanciais, não recordo em que contexto, o poeta diz-me qualquer coisa semelhante: – “Isto de um homem ter mais sensibilidade…” (…)

Era essencialmente desta parte que eu gostaria de recuperar.

Foi dentro de um hospital que fui tomando mais contacto com a sua realidade, o seu sofrimento, a sua dor. Que tanto me consumia, que me doía.

Além de convergirmos em Torga, contou-me umas pouquinhas particularidades de Miguel Torga, e, subsequentemente, de si.

A admiração a Carlos Carranca – não sei nem quero saber como – passou a ser, também para mim, um sofrimento diário. Mesmo quando não falávamos, era como se me falasse, me falasse de si; algumas vezes através do seu “Diário”, com as suas pequenas frases eu sofria e nem sempre conseguia cumprir com as minhas palavras de tentativa de alento.

Um dia partilhei à beça um pequenito texto/reflexão seu.

Para mim, escrevi um dia qualquer coisa como “quando os encómios são superlativos, a palavra, o verbo, cala! E tudo o que eu disser é, realmente, coisa pouca, sempre coisa pouca”.

E era neste reduto que eu estava. Até que há poucos dias, ouvi um vídeo do vate a cantar.

Pensei para comigo: vais calar-te, Carranca.

Magoou-me tanto ver e ouvir cantar um homem da palavra, da canção e mesmo um dizedor, que não sei como dizer – que tomo nota do seu perecimento. Foi quando eu recuperei: “quando os encómios são superlativos, a palavra, o verbo, cala”. E eu também me calo.

019/08/30
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