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Odette Mutto e a narrativa cortante da condição humana

Conforme bem acentuou o escritor Caio Porfírio Carneiro, Odette Mutto “..sabe, como poucos, recriar a realidade da vida, em dimensão de arte, quase num passe de mágica.”

Formada em odontologia, Odette começou a escrever ainda muito jovem e publicou seu primeiro livro, Quinze mais um, prefaciado por Afonso Schmidt, em 1960. A ele sucederam-se Alienação (1984), Bandido (1987), Retrato do tempo inteiro (1991), Marca de nascença (1998), O Russinho (2003) e Viva o Brasil (2016), além de colaborações nos jornais O Estado de S.Paulo, Folha de São Paulo, Linguagem Viva e O Escritor.

Quando a descoberta da leitura?

Alfabetizada aos seis anos, já saí lendo um jornal semanal italiano, no idioma original.

Que autores considera centrais em sua formação?

Ernest Hemingway, William Somerset Maugham, Machado de Assis.

 E a pulsão da escrita, em que fase da vida se deu?

Aos onze anos.

Em Quinze mais um, seu livro de estreia, publicado em 1960, é possível observar personagens esmagados pela dinâmica da vida. Em seus livros posteriores, eles retornam com larga intensidade. Correto dizer que na gênese da escritora há desencanto com a condição humana?

Desencanto não. Análise real da condição humana, da vida.

Considera-se mais realizada no conto ou no romance?

Escrevo conto e romance empurrada por um impulso interior, não sei se sou realizada em algum deles.

Retrato do tempo inteiro, seu primeiro romance, com intenso realismo, traz a saga de uma imigrante italiana em terras brasileiras. Ao escrevê-lo, houve o intuito de homenagear a força daqueles que ajudaram a construir a pujança da capital paulista, no século XX?

Retrato do tempo inteiro é um acerto de contas entre uma imigrante italiana, analfabeta e idosa, e seu entorno familiar. Ao escrevê-lo, não pensei em homenagear ninguém.

Marca de nascença, seu segundo romance, novamente seguindo cortante realismo, trata dos conflitos motivados pela sexualidade do protagonista. O que a levou a tratar do tema?

Marca de nascença, romance verídico, doeu muito em mim pela sorte do protagonista.

A cidade de São Paulo, nos anos 1940, cenário de “O Russinho”, publicado em 2003, é fotografada com seus tipos humanos. A observação do cotidiano da cidade em que nasceu e sempre viveu a influenciou na construção do romance?

A cidade de São Paulo não me influenciou quando escrevi o O Russinho, ela é apenas o lugar onde os fatos ocorreram.

 Seu livro mais recente, Viva o Brasil… ,mostra ao leitor muitas de nossas mazelas sociais e o país paradoxal que ainda somos. Algum antídoto para isso?

Vi os primeiros migrantes nordestinos chegarem, em 1950, na Estação da Luz, São Paulo, trazendo seus poucos pertences embrulhados em lençol desembarcando de paus de arara. Passaram sessenta anos e hoje muitos deles estão empurrando

carrocinhas (tração humana) para catar lixo. Não dá para ver e não dizer nada.

Novos projetos literários em gestação?

Sim. Escrever é mais forte que a minha própria vontade. Então, vamos lá.

Sobre os autores da entrevista: Angelo Mendes Corrêa é mestre em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo (USP), professor e jornalista. Itamar Santos é mestre em Literatura Comparada pela Universidade de São Paulo (USP), professor, ator e jornalista.

 

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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