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A refém

Àquela hora da tarde, quase no fim do expediente bancário, na agência havia mais funcionários do que clientes. Quando o homem entrou na fila do caixa e passou o braço pelo pescoço de uma moça de aproximadamente 20 anos, puxando-a para a parede e segurando com a outra mão debaixo da jaqueta dela um pedacinho de cano de pvc como se fosse arma, os três seguranças ficaram sem reação.

— Ponham as armas no chão, rápido! – gritou o bandido, com um forte sotaque francês, apertando o pescoço da refém. — E abram a porta para o meus companheiros entrarem. Rápido, senão ela morre!

Quando os guardas olharam para a porta de vidro, já três outros bandidos esperavam, empunhando revólveres e uma assustadora calibre doze. Os guardas deixaram os cinturões com as armas no chão, desligaram o alarme da porta e ergueram os braços. Os homens entraram, um deles ficou de plantão do lado da porta, um subiu quatro degraus de uma escada de onde teria privilegiada visão da agência e o outro se dirigiu até a gerente, que tremia de pé do lado da sua mesa.

— Vamos logo, mulher, leve-me até o cofre. Rápido, rápido, rápido!

E seguiu-a, com o revólver pressionando as costas da funcionária, que tinha os olhos arregalados de pavor. Os sete clientes, dois na fila, os que aguardavam sentados e os demais funcionários foram mandados deitar no chão, todos no meio da agência, com os braços esticados ao longo do corpo. O homem com a refém, que apertava agora nas costas dela um revólver entregue por outro ladrão, continuava mandando que ficassem quietos, que mantivessem a calma, que colaborassem.

Cinco minutos nesta tensão, enquanto esperam a gerente e um dos ladrões voltarem com o dinheiro, mais dois clientes, uma mulher e um homem entram e só percebem a situação já dentro da agência. O homem grita e tenta girar a porta pra sair, mas o ladrão com a espingarda dá-lhe uma coronhada de leve na cabeça, ele fica tonto e é arrastado e jogado junto das outras pessoas deitadas, enquanto a mulher, amedrontada e temendo também ser agredida, de mãos erguidas vai e rapidamente deita-se no chão.

A gerente retorna com o outro homem, que carrega um grande malote cinza abarrotado de dinheiro e fechado nos grossos zíperes. O homem manda que ela deite entre os outros e diz:

— Vamos sair com a refém. Esperem cinco minutos deitados, com a cara no chão, de olhos fechados e as mãos pra trás. Se tentarem alguma reação ou chamarem a polícia, a refém morre!

A moça que fora tomada como refém pelo primeiro homem chora e grita:

— Não! Pelo amor de Deus! Deixem-me ficar, não vou fazer nada. Tenho uma filhinha pequena! Pelo amor de Deus!

O homem dá um safanão nela e manda que se cale. Sai da agência levando-a, agora com o revólver pressionando a sua nuca. Um dos comparsas dá cobertura aos demais e depois sai, de costas, com a calibre doze apontando para o grupo de pessoas deitadas. Ninguém se mexe, até que depois de alguns minutos percebem que os assaltantes já foram e aos poucos vão se levantando, temerosos, olhando para fora, se recompondo.

Em poucos minutos duas viaturas policiais chegam ao banco e outras duas percorrem as redondezas atrás dos bandidos. Os agentes interrogam os clientes e funcionários, colhem impressões digitais, verificam as imagens das câmeras e pesquisam nos comércios próximos sobre carros e pessoas estranhas que foram vistos por ali. Nada. Os ladrões pareciam mesmo profissionais altamente qualificados.

Uma semana depois, na delegacia.

— Todas as impressões digitais são dos funcionários e clientes, delegado – diz o investigador. — Agora só nos resta descobrir quem são os bandidos pelas imagens e pelos retratos falados. E pelas vozes… parece que há estrangeiros no bando.

— Sim, e precisamos resolver isto logo, afinal eles levaram uma refém e até agora não temos notícia se a libertaram. Nem quero pensar na possibilidade de eles a matarem. Imagine a opinião pública, o que sairá nos jornais, no rádio, na tv.

— E também não descobrimos nada sobre a moça tomada como refém. Os funcionários disseram que foi a primeira vez que a viram na agência e nenhum outro cliente presente na hora do assalto a conhecia.

— E o pior, Mauro – o delegado franziu a testa, preocupado. —, é que foi esta mesma quadrilha que roubou o outro banco há dois meses e também levou uma refém.

— É, mas a libertaram no dia seguinte. A mulher ligou pra avisar que estava livre, mas negou-se a comparecer ao distrito pra ajudar a localizar o bando. E ela nem quis se identificar, alegando que os bandidos ameaçaram matá-la junto com toda a família se ela não ficasse quietinha. Atitude que nos deixou de mãos atadas.

— O mais curioso é que no outro banco roubado também não ficaram impressões digitais dos ladrões, apesar de clientes e funcionários afirmarem que eles não usavam luvas. Nem máscaras usavam e mesmo assim não identificamos nenhum deles através das imagens. Deve ser gente de fora e que ainda não tem ficha criminal.

— É, doutor delegado, a credibilidade da polícia está mesmo em baixa…

— Da polícia não, Mauro, da nossa equipe, da nossa delegacia, única da cidade. Tanto que o secretário de segurança da capital está enviando pra cá um investigador com muita experiência em roubo a bancos que, segundo seu prontuário, nunca deixou um crime sem solução. O cara é especializado em várias técnicas de investigação, é inclusive médico perito em criminologia dos mais gabaritados. Recebi a ligação do secretário ontem, orientando para fazermos tudo o que o investigador pedir. É como se eu nem fosse mais delegado…

— Por acaso este detetive é o tal “Poirot Brasileiro”, o que sempre aparece na tv e nos jornais?

— Ele mesmo. Até o nome dele lembra o herói: Hércules. Ainda bem que a Agatha Christie não tem mais como saber disto… Além de médico o cara é psicólogo e gosta de trabalhar sozinho. Veja aqui o prontuário do homem.

— Mas o cara é bom mesmo… – resmunga o policial, depois de alguns minutos. E analisando a foto: — Também se veste impecavelmente, com ternos finos, tem um bigode grande, porém é alto e forte.

Às 8 da manhã seguinte, no distrito.

— Senhor delegado, prazer. Sou o Hércules P, agente federal. Vim de Brasília para ajudar nas investigações.

O delegado pensou que, se ele vinha da capital federal, devia ter mesmo sólida experiência em casos de roubos e outras falcatruas.

— Prazer, Hércules. Fique à vontade. Venha, vou te apresentar parte da minha equipe, os outros policiais estão nas ruas. Diga-me, o que significa este P do seu nome?

— Não é Poirot, já lhe adianto. É somente P, delegado. Sem ponto.

Os policiais se apresentam ao investigador enquanto tomam café. Ali mesmo começam a falar do assunto que levou Hércules até a cidade e ele ouve com curiosa atenção as opiniões dos policiais.

— É um caso diferente de todos o que já desvendei, senhores. Bandidos que mesmo sem usar luvas não deixam impressões digitais; não usam máscaras ou capuzes e suas caras não constam dos nossos cadastros; uma refém que depois de solta não se identifica…

— E a última refém, da qual também não temos impressões digitais… – o delegado é interrompido por um policial que entra correndo:

— Doutor, doutor, veja esta foto! Foi deixada no para-brisa da viatura em frente da delegacia.

O delegado segura a foto, analisa por alguns segundos e a entrega ao Hércules, que em seguida pergunta:

— Quem é a moça, delegado?

— A refém do último roubo ao banco. Executada com um tiro na testa, pelo que podemos ver.
Hércules volta-se para o policial que trouxera a foto:

— Ninguém viu quem colocou o retrato na viatura? – e diante da resposta negativa prossegue. — Então vamos ver logo a câmera da entrada do distrito.

O delegado e os policiais entreolham-se. O primeiro diz:

— A câmera quebrou na semana passada, Hércules. Chamamos o técnico, mas ele só volta de férias na semana que vem.

E então a reação imediata do investigador mostra-lhes porque ele é tão conhecido e eficiente no que faz:

— Que absurdo, delegado! Creio que esta é a única delegacia no país inteiro que não tem uma câmera de vigilância na porta. Duas semanas quebrada… só há um técnico na cidade toda? Bem, vamos então ao que temos à nossa disposição. Quero ver todas as imagens dos dois assaltos, de dentro e das imediações dos bancos, as imagens dos ladrões, as impressões que porventura conseguiram recolher. E agora temos uma morte, o que agrava de vez a situação. Mande alguns homens fazerem uma varredura imediatamente nos quarteirões próximos daqui. Talvez consigamos pegar quem deixou a foto na viatura há pouco.

— Vamos avisar as autoridades e a imprensa sobre a foto, Hércules? – pergunta o delegado, cabisbaixo depois da repreensão que o investigador deu em toda a equipe.

— Não, senhor delegado. Se, como no outro roubo, nenhum parente da refém apareceu na delegacia, vamos manter o sigilo enquanto investigamos. Deixe tudo por minha conta. Se me permite, gostaria de conduzir as diligências.

— Sem dúvida, Hércules, estamos às suas ordens.

Cinco dias depois, uma ligação anônima denunciava que um banco estava sendo assaltado naquele momento na Zona Sul da cidade. As viaturas — havia apenas quatro na cidade — seguiram em disparada para o endereço, com as sirenes desligadas por ordem do investigador. Duas viaturas ficaram atravessadas nas esquinas da rua e as outras duas, cada uma de um lado da agência, isolando o trânsito. Os homens, agachados atrás dos carros, apontaram as armas para a entrada do banco e com o megafone o delegado anunciou:

— Atenção! Atenção! É a polícia! A agência está cercada pela frente e pelos fundos! Saiam com as mãos pra cima! Vocês não têm como fugir!

E o delegado repetiu isto por diversas vezes.

Hércules, que era também franco atirador e apontava o seu rifle de alta precisão para a porta do banco, ordenou:

— Só atirem quando eu mandar.

Daí a pouco ouviram de dentro da agência:

— Está bem, vamos sair! Mas estamos com uma refém. Está vindo um furgão nos pegar na porta do banco. Deixem que ele passe pelas viaturas. Vamos entrar no carro com a refém e se alguém atirar ou nos seguir ela morre. Não estamos brincando.

Mais um minuto e um furgão preto blindado passa calmamente pela barreira policial e estaciona em frente do banco. Quatro homens fortemente armados saem da agência com um malote cheio, um deles com o braço envolto no pescoço da refém e o revólver encostado na sua nuca. Eles param na calçada e olham para os lados. Neste momento Hércules aciona o gatilho do seu rifle, atingindo a testa da refém. O ladrão que a segurava, pego de surpresa, deixa cair o corpo da mulher e tenta junto com os comparsas entrar no furgão, porém o motorista deste, assustado com a inesperada reação da polícia, fecha a porta e sai em alta velocidade, enquanto os policiais atiram no veículo e nos quatro bandidos na calçada que, vendo-se encurralados, começam a disparar contra os policiais protegidos atrás das viaturas. Dois assaltantes morrem na hora e os outros dois feridos são levados para o hospital mais próximo. Os corpos da mulher e dos dois assaltantes ficam ali na calçada, enquanto a imprensa vai chegando.

— Hércules, o que aconteceu? Você matou a refém! Ficou maluco? Como vai explicar isso? Sua carreira acaba aqui, homem! – o delegado disfarça um leve sorriso, imitado por outros policiais.

— Não se preocupe, delegado. Eu programei tudo isto minuciosamente. Depois de todas as investigações, de todos os meus cálculos, eu já tinha quase concluído este caso. Para encerrá-lo, só faltava o que aconteceu hoje, aquela ligação denunciando este roubo em andamento. Lá no distrito explico tudo, temos mesmo que preparar a documentação para fecharmos o caso. E temos dois feridos, se pelo menos um deles sobreviver, confessará tudo.

O furgão preto foi perseguido por duas viaturas e algumas quadras depois bateu de frente com violência num poste, matando o motorista prensado nas ferragens. Dentro do carro, a polícia encontrou documentos dos seis componentes do bando e provas de outros roubos.

Um dos feridos atingidos na porta do banco morreu no início daquela noite no hospital, o outro passava bem e foi levado para a cadeia, sendo interrogado por três horas. Os policiais do distrito tentavam acalmar a imprensa e outros cidadãos que se aglomeravam em frente da delegacia. Para amenizar aquele tumulto, Hércules instala um microfone na porta e se prepara para a sabatina.

— Detetive Hércules, como explica a morte da refém, da qual o senhor foi o algoz? – pergunta o primeiro repórter e atrás dele ouve-se um coro: É verdade, Hércules!

— Calma, pessoal, se ficarem quietos, meu relato responderá a esta e a todas as demais perguntas – e prossegue. — A moça não era refém, fazia parte do bando, o que eu concluí durante as investigações.
Um murmúrio de surpresa ecoa na multidão de repórteres e curiosos.

— Pois bem, a primeira coisa que fiz foi solicitar ao juiz os mandados para liberação das imagens das câmeras de gravação dos imóveis vizinhos aos bancos assaltados. No primeiro assalto e no segundo, inicialmente só foram analisadas as imagens internas e da porta de entrada dos bancos. Não havia impressões digitais em nenhum dos casos, apesar de aparentemente os assaltantes não usarem luvas.

Este ponto foi relativamente fácil esclarecer. Meu irmão é perito do FBI em Washington e já trabalhou em casos parecidos. Com a ajuda dele, verificamos detalhadamente as imagens ampliadas das mãos dos bandidos e descobrimos que eles usavam luvas finíssimas confeccionadas com pele sintética e sutilmente coloridas com tinta que imita a pele de cada um dos componentes do bando. O mesmo material das máscaras faciais que usavam. Estas luvas aderem perfeitamente ao contorno de cada mão e da face, sem deixar marcas ou dobras e de tão transparentes permitem que se vejam com perfeição até as unhas. Daí a ausência de impressões, inclusive da suposta refém.

Ele silencia alguns segundos e continua, depois de passar com os olhos uma revista na atenta plateia.

— Nas imagens internas do primeiro e segundo assaltos, tomadas de ângulos diversos, a mulher usada como refém entra no banco pouco antes dos ladrões, seguida após um minuto de um homem que vai igualmente para a fila. Logo depois este homem a agarra e anuncia o assalto, arrastando-a para o canto da sala e os outros homens do bando entram na agência. No primeiro caso a mulher é morena, bem jovem, só tem à mostra os cabelos castanhos curtos, o rosto, o pescoço e as mãos, usa óculos claros, tem altura mediana e o corpo magro e atraente. No segundo roubo, dois meses depois, ela está loira, não usa óculos e os cabelos estão longos. As demais características do seu perfil são idênticas. Em detalhadas observações, pude concluir pelos traços do rosto, dos olhos azuis, do desenho das orelhas, nariz, boca, pescoço e mãos que se deixam ver nitidamente através das luvas transparentes, que se tratava da mesma pessoa. As imagens dos homens, inclusive daquele que a faz refém, também revelam que são os mesmos em todos os assaltos.

Outra pausa e ele continua:

— E, para sanar outras dúvidas, já sabendo que a mulher não era cliente do banco e só fora vista naquelas duas vezes, vamos às outras imagens. Retrocedendo as gravações a partir da entrada dos bancos, as imagens cedidas pelos dois imóveis vizinhos mostram nos dois casos uma mulher saindo de um furgão preto estacionado a uma quadra antes e se dirigindo às agências. Depois sai do furgão um homem que a segue. Os dois já na fila do banco, depois de estudar minuciosamente por cerca de dois minutos todo o ambiente, ela saca discretamente de um celular e com ele na altura da cintura disca um número porém nada diz, espera alguns segundos e desliga. É o sinal combinado para avisar aos três comparsas que continuam no furgão junto com o motorista que o caminho está livre. Então o homem atrás dela passa o braço pelo seu pescoço e enfia a outra mão por baixo da jaqueta, simulando segurar uma arma. Em seguida entram os outros três ladrões. No carro permanece o motorista que só estaciona na porta da agência quando recebe por celular o aviso que os outros estão saindo para a fuga. As placas do veículo são falsas.

— Mas e a mulher morta da foto encontrada no para-brisa da viatura? – grita um cidadão.

— Que mulher morta? Aquilo era maquiagem profissional. Consultamos outros peritos que foram unânimes em dizer que o sangue era tinta e o furo na testa era falso. O buraco da bala, o fio de sangue escorrendo… tudo obra de grande maquiador, que por sinal era este bandido que sobreviveu e que já confessou tudo. Ele era o chefe do bando. Em todos os roubos a mulher e os homens usavam também as mesmas maquiagens faciais, mudando significativamente suas feições originais. A foto da falsa mulher morta foi uma estratégia usada para nos dizer: “Olha, não brincamos em serviço, vejam o que somos capazes de fazer.” Mas antes mesmo da confissão do chefe eu já sabia de tudo isto. Faltava identificar os nomes dos ladrões e de onde vinham. Agora com os documentos deles em poder da polícia, descobrimos que todos eram franceses, procurados pelas autoridades policiais parisienses pela mesma técnica usada em roubos a bancos de lá. Somente o chefe, que era irmão da mulher que atuava como refém, trabalhou durante seis meses como maquiador na maior rede de tv do Brasil. Ele veio ao nosso país para preparar a vinda dos companheiros de crime. Todos moravam numa cidade vizinha e só apareciam aqui na hora programada para os roubos e imediatamente voltavam para o seu esconderijo. Daí a dificuldade de haver mais pistas deles antes e após os assaltos…

Um dos repórteres interrompe: — Mas, detetive, apesar de tudo o que o senhor nos disse, antes do último roubo, antes de matar parte do bando e prender o chefe da quadrilha, mesmo com tantas evidências, não foi um grande risco atirar na refém? E se o senhor estivesse enganado?
Hércules respira, bebe um copo de água e responde com toda a segurança de um experiente policial:

— Eu não tinha dúvidas de que ela era o chamariz, a peça-chave do bando. Como já lhes disse, ficamos dias e dias analisando as imagens ampliadas e de vários ângulos da mulher e dos homens saindo do carro, entrando nas agências, até quando todos fugiam sem serem perseguidos. As imagens não mentem e um detalhe importante que nos deu a certeza de que ela pertencia ao bando foi o seu comportamento nos dois casos. Ela entrava normalmente no banco e quando o homem a pegava como refém na fila, ela atuava bem, arregalava os olhos, gritava, tremia, suplicava pra não ser levada. No segundo roubo, visivelmente desesperada, ela até implorou à gerente que entregasse logo o dinheiro para que os ladrões fossem embora. Porém, na saída do banco após os dois roubos, as imagens da câmera que pega todo o movimento da calçada já mostram uma mudança no seu rosto, uma serenidade, uma despreocupação.

Ali foi a falha dela como atriz, quando já se achava segura. Esqueceu que a cena ainda estava sendo gravada. Até do seu corpo sumiam aquela rigidez e aqueles falsos tremores percebidos dentro da agência. Inclusive na primeira vez vimos nela um leve sorriso de satisfação e não de nervosismo, pelo sucesso do roubo. E quando ainda estava na fila, retrocedia um passo e encostava o corpo no seu companheiro de gangue, para que ele a segurasse. Portanto era ela e não o seu comparsa quem escolhia o momento exato em que deveria ser agarrada. Eram muitos e fortes os indícios que davam a certeza que precisávamos para agir como fizemos no terceiro roubo. Pois bem, senhores, já têm tudo para as suas matérias. Agora, se me dão licença…

Um dos curiosos pergunta-lhe: — Senhor Hércules, vai continuar trabalhando aqui na delegacia da cidade? Sabemos que há outros casos ainda não solucionados pela nossa polícia.

— Não, meu amigo. Até que gostaria, mas acabo de ser convidado a conduzir lá na capital federal as investigações sobre um grave e misterioso assassinato de um candidato a senador.

— Pássaro grande, este que morreu, detetive?

— Sim. Ave de rapina, como são quase todas as aves daquele grande ninho… as que roubam, as que matam e as que morrem.


Remisson Aniceto
Conto do livro Leva-me Contigo, a Senhora S & Outras Histórias – Editora Penalux, 2016

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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