Vários episódios da série “Orçamento de Estado 2025” foram transmitidos nos órgãos de comunicação social, ao longo das últimas semanas. É uma série tão rica no seu enredo que ninguém consegue prever o seu desfecho. Afinal de contas, os “plot twists” são tão comuns nesta série que, no caso de perdermos um dia, isto é, um episódio, podemos ficar imediatamente desatualizados.
Um Orçamento de Estado é a base para o exercício de um Governo, na medida em que define uma previsão discriminada das receitas e despesas do Estado para o ano económico que se avizinha. Depois de elaborado, o Orçamento é apresentado à Assembleia da República, que o discute e o aprova, ou não. Fruto das mais recentes eleições legislativas, a representação partidária na Assembleia da República está bastante fragmentada, o que dificulta a aprovação do Orçamento de Estado. Para ser aprovado, não basta que a bancada parlamentar do PSD vote a favor. Será, também, necessário que a bancada parlamentar do PS, pelo menos, se abstenha. Todavia, seria possível verificar-se a aprovação do Orçamento de Estado no caso de o Chega se juntar ao PSD, o que não será de prever, muito embora seja difícil prever algo oriundo deste Partido. É certo que o chumbo do Orçamento não implica, necessariamente, eleições, mas, face ao contexto mundial atual, seria muito prejudicial para o país ficarmos sem um Orçamento de Estado aprovado para o ano de 2025.
Assistimos a um Partido Socialista internamente dividido. Vozes sonantes dizem que o Partido deve viabilizar o Orçamento, entre elas Fernando Medina, Sérgio Sousa Pinto e José Luís Carneiro. Pelo contrário, Marina Gonçalves e Isabel Moreira, entre outros, defendem que os Socialistas devem chumbar o Orçamento. Se estivéssemos a falar do Partido Chega, seria a voz do líder a única a pesar na decisão final. Contudo, o PS tem uma dimensão que ultrapassa a pessoa que, num certo e determinado tempo, ocupa o cargo de Secretário-Geral do Partido. Note-se, é evidente que é na pessoa que ocupa o cargo que recai a responsabilidade máxima de transmitir a decisão a público. Mas desengane-se quem crê que apenas a vontade do líder conta. Necessariamente, Pedro Nuno Santos ficaria numa posição muito difícil dentro do Partido Socialista se inviabilizasse o Orçamento. E digo-o não só por estar a ir ao desencontro da vontade das grandes personalidades do Partido, por estar já algo fragilizado internamente, mas também porque Pedro Nuno não iria “sobreviver” a novas eleições legislativas. O próprio disse, na mais recente entrevista que deu à TVI/CNN, que, se fosse a eleições, o resultado para os Socialistas não seria positivo. Face ao contexto atual do Secretário-Geral, seria muito difícil permanecer no cargo depois de sair derrotado de eventuais eleições. Desta feita, estou profundamente convencido que o Partido Socialista vai viabilizar o Orçamento de Estado. O trabalho que foi desenvolvido entre os dois atuais maiores Partidos, com vista a uma aproximação de ideias plasmadas no Orçamento, deixa o PS com poucas “desculpas” para o inviabilizar. De facto, o Governo apresentou um Orçamento de Estado razoável, algo distante do que se propôs em campanha eleitoral, mas o possível em razão da necessária aproximação às ideias dos Socialistas, fulcrais para a existência de um Orçamento para 2025.
Não consegui, ainda, perceber como André Ventura quis entrar num despique com Luís Montenegro, tendo por base da “luta” averiguar qual dos dois tinha a palavra mais credibilizada. O Presidente do Chega entrou na disputa derrotado antes mesmo de lha dar início. Ora, após ter trocado várias vezes de opinião sobre se o Chega iria ou não aprovar o Orçamento de Estado, dizendo, em direto, que o iria rejeitar categoricamente e, dias mais tarde, também em direto, dizendo que não era bem assim, que tinha de ouvir a sua bancada parlamentar, André Ventura tinha já a sua palavra vista como pouco séria. Estava fresco na cabeça das pessoas esta troca sucessiva de opinião do próprio, pelo que um jogo de palavra mais credível não veio na melhor altura. Bem sei que, caso André Ventura não interviesse, de alguma forma, na conversa do Orçamento, seria “empurrado” para a insignificância, algo que, por questões óbvias, seria prejudicial para o Partido. Mas não sei até que ponto não seria melhor ficar uns dias sem aparecer nos telejornais, deixar acalmar os ânimos sobre o tema mediático, e, aí sim, manifestar uma posição mais séria sobre uma possível ou não viabilização do Orçamento. Esta saída do líder do Chega fez-me lembrar as eleições para o Presidente da Assembleia da República, em que afirmava que havia um acordo, mas depois já não havia acordo nenhum. Enfim, se a credibilidade é fundamental na vida, na política não o é diferente.
Por fim, devo dizer que discordo da opinião de que, se é para haver aproximação a ideias Socialistas, mais vale convocar eleições. Nada nos garante que, se fossemos agora chamados às urnas, o contexto político iria mudar radicalmente, concedendo a um Partido a capacidade para governar com maioria absoluta. Aliás, muito pelo contrário, parece-me que a diferença que se iria notar não justifica o custo de novas eleições. Se houver responsabilidade por parte de quem está a exercer os cargos políticos, e se houver uma preocupação maior pelos portugueses, e menor pelos interesses partidários, certamente que será possível viver com o contexto político atual, exigente, dividido, mas decretado pelos portugueses quando foram chamados a votar.
Francisco Pereira Baptista